domingo, 30 de novembro de 2008

Seu espinho,seu espinho
Em conversas com a flor
Teria ela lhe dito
Que mentira acaba o amor?


mentira acaba o amor.Mentira acaba mesmo o amor.Mentira não é amor.Definitivamente.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

São João


Não fosse o som dos fogos a estourar e colorir de azul e vermelho o negro céu, ela teria ouvido quando ele murmurou “eu te amo”. Mas seus ouvidos atentavam-se à dissonância toda; nos olhos arregalados fulgurava o reflexo policromático da pirotecnia. Pois assim, não ouviu o som e tampouco viu os lábios bailarem na confissão apaixonada e vã. Ao cabo de tudo, ainda num redondo riso, a fascinada menina disse ao frustrado menino “deve ser lindo ver os fogos com quem se ama, né?”.

O rapazote mantinha os olhos no chão. Encarava o sapato, cabisbaixo como são os corações partidos. Respondeu um “é, deve ser” de malgrado. Teve tanto ódio daqueles fogos que, por reflexo, engoliu a paçoca numa mordida só. Engasgou. Debateu-se. Sufocou-se.

Antes de morrer, não disse coisa alguma. Apenas pigarreou, esperneou, cambaleou, roxeou, desfaleceu. A menina se apercebeu do óbito apenas quando a última luz brilhou no alto e o som se calou por completo.

Silêncio na noite de São João.


Rodolfo Viana

sábado, 15 de novembro de 2008


Meu amor,Rosinha,tem nome de saudade
Vive fora da cidade,e eu já não sei o que faço
Pra chamá-la de uma vez pra morar aqui comigo
Dormir na rede da varanda, fazer dela meu abrigo
E de noite,se deixar..ah,se ela descuidar
Vou abraçar tanto e beijar,mas antes eu nem aviso.

O meu amor, ô dona Rosinha
É uma coisa tão minha,tão fina e bonitinha
Que não me canso de olhar
E quando chego bem cansado daquele trabalho duro
Fico pensando.. durmo,não durmo
Só sonhando.. vendo a hora ela chegar
Pra jogar fora saudade e cansaço
E quando ela chega..
Fica me esperando na janela a tarde inteira
E à noite faz fogueira pra esquentar o meu abraço.


sexta-feira, 14 de novembro de 2008

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

terça-feira, 4 de novembro de 2008

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

outra vez
Mas desta vez..
Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos..

Cecília Meireles

sábado, 1 de novembro de 2008

Para uma menina com uma flor

Porque você é uma menina com uma flor e tem uma voz que não sai, eu lhe prometo amor eterno, salvo se você bater pino,
o que, aliás, você não vai nunca porque você acorda tarde, tem um ar recuado e gosta de brigadeiro: quero dizer, o doce feito com leite condensado.

E porque você é uma menina com uma flor e chorou na estação de Roma porque nossas malas seguiram sozinhas para Paris e você ficou morrendo de pena delas partindo assim no meio de todas aquelas malas estrangeiras.

E porque você sonha que eu estou passando você para trás, transfere sua d.d.c. para o meu cotidiano, e implica comigo o dia inteiro como se eu tivesse culpa de você ser assim tão subliminar. E porque quando você começou a gostar de mim procurava saber por todos os modos com que camisa esporte
eu ia sair para fazer mimetismo de amor, se vestindo parecido. E porque você tem um rosto que está sempre um nicho, mesmo quando põe o cabelo para cima, parecendo uma santa moderna, e anda lento, e fala em 33 rotações mas sem ficar chata. E porque você é uma menina com uma flor, eu lhe predigo muitos anos de felicidade, pelo menos até eu ficar velho: mas só quando eu der uma paradinha marota para olhar para trás, aí você pode se mandar, eu compreendo.

E porque você é uma menina com uma flor e tem um andar de pajem medieval; e porque você quando canta nem um mosquito ouve a sua voz, e você desafina lindo e logo conserta,
e às vezes acorda no meio da noite e fica cantando feito uma maluca. E porque você tem um ursinho chamado Nounouse e fala mal de mim para ele, e ele escuta e não concorda porque ele é muito meu chapa, e quando você se sente perdida e sozinha no mundo você se deita agarrada com ele e chora feito uma boba fazendo um bico deste tamanho. E porque você é uma menina que não pisca nunca e seus olhos foram feitos na primeira noite da Criação, e você é capaz de ficar me olhando horas. E porque você é uma menina que tem medo de ver a Cara-na-Vidraça, e quando eu olho você muito tempo você vai ficando nervosa até eu dizer que estou brincando.
E porque você é uma menina com uma flor e cativou meu coração e adora purê de batata, eu lhe peço que me sagre seu Constante e Fiel Cavalheiro.

E sendo você uma menina com uma flor, eu lhe peço também que nunca mais me deixe sozinho, como nesse último mês em Paris; fica tudo uma rua silenciosa e escura que não vai dar em lugar nenhum; os móveis ficam parados me olhando com pena;
é um vazio tão grande que as mulheres nem ousam me amar porque dariam tudo para ter um poeta penando assim por elas, a mão no queixo, a perna cruzada triste e aquele olhar que não vê. E porque você é a única menina com uma flor que eu conheço, eu escrevi uma canção tão bonita para você, "Minha namorada", a fim de que, quando eu morrer, você, se por acaso não morrer também, fique deitadinha abraçada com Nounouse cantando sem voz aquele pedaço que eu digo que você tem de ser a estrela derradeira, minha amiga e companheira, no infinito de nós dois.

E já que você é uma menina com uma flor e eu estou vendo você subir agora - tão purinha entre as marias-sem-vergonha
- a ladeira que traz ao nosso chalé, aqui nessas montanhas recortadas pela mão de Guignard; e o meu coração, como quando você me disse que me amava, põe-se a bater cada vez mais depressa.

E porque eu me levanto para recolher você no meu abraço, e o mato à nossa volta se faz murmuroso e se enche de vaga-lumes enquanto a noite desce com seus segredos, suas mortes, seus espantos - eu sei, ah, eu sei que o meu amor por você é feito de todos os amores que eu já tive, e você é a filha dileta de todas as mulheres que eu amei; e que todas as mulheres que eu amei, como tristes estátuas ao longo da aléia de um jardim noturno, foram passando você de mão em mão até mim, cuspindo no seu rosto e enfrentando a sua fronte de grinaldas; foram passando você até mim entre cantos, súplicas e vociferações - porque você é linda, porque você é meiga e sobretudo porque você é uma menina com uma flor.

Vinicius..