domingo, 29 de dezembro de 2013

Querida Jaborandinha

Neste bilhetinho a minha vontade é enchê-la de carvão. Meu lenitivo imaginário sempre foi encher a sua cara de carvão como fazem os torradores de castanha de caju em pleno verão quando as castanhas secas estão no ponto pra serem queimadas e vendidas na beira da pista. Minha doce e querida florzinha cultivada no meu quintal e regada mês em mês, tens um rosto tão suave que mais me lembra um açude em tempo de chuva. Tudo em ti é chuva, é inverno, é verão, é o calor do fogo torrando castanha, é um brilho de gliter no carnaval, um cheiro de flor-de-sapo, um som de Anum. Teu rosto é sinestésico. Tua alma é sinestésica. Tu és uma doce confusãozinha  que redemoinha minha cabeça, só a tua partida que não.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Leo

Meu saudoso e inconstante cordeirinho,
penosos como as águias no por do sol são teu suor, tuas unhas cortadas e teu desterro. Hoje juntando lavagem para os porcos recordei você e os caroços de fava contadinhos no nosso velho e enferrujado depósito. Todo os dias a lembrança anda, todos os dias a natureza e o som genuíno do vento andam, e tu és, querido, como uma "váge" de capim depois da chuva, encoberta por botõezinhos de acerola que despencam das aceroleiras ou por flor-de-sapo, e não há um só dia em que eu toque o vermelho cádmio ou o verde pinheiro e não lembre das tuas vestes, da tua resta na janela...
Não há uma tarde que se passe sem sobejo da lembrança da tua boca de sede nos copos de cristal. Eu o amo até hoje, e tua morte( que ocorre como uma morte), ainda é um cancro na minha alma.

meu coração pressente o fim dos tempos neste selo.

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Fardo

Borges era de uma beleza que espancava
Ora minha cara,
Ora meu coração,
Ora a alma.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

10/09

Querido Leopardo,

Há quanto não mando notícias... mas estou sentado no boteco da rua do centro, e seria quase um crime não avisá-lo: Eu sinto a vida. Sinto aqui. Sinto e senti ontem, quando acordei às pressas pra tomar o ônibus. Ainda me sinto sufocado, por certo que sim, e é algo como fosse tentando voltar. O sítio já foi o que eu quis, mas muita coisa hoje é só saudade. Aqui talvez me sinta mais pleno por causa do suor. Tudo aqui é suor, tão  suor e restrição, que uma árvore na frente de casa é quase poesia. Além do mais, quem disse que a vida não ressurge do marasmo?
não que eu não queira estar em casa, pertinho do pasto e do barreiro cheio, mas tudo isso também é minha vida: o viaduto, a BR duplicada... ou talvez não. Talvez tudo isso foi e venha sendo um presságio de que a vida seria difícil. A minha e a da moça do Lojão das portas. A paisagem da vista pro asfalto deve ser triste no pingo do meio dia, coitada. Mas destinado a aceitar o fardo, tento me acomodar sempre no meu colchão ou na sala de algum consultório, ou no banco de alguma praça. É inútil. Sou estrangeiro no meu lar e em toda parte. Talvez seja hora de me estabelecer, ou eu não tenho o propósito arrogante de SER. É preciso agarrar a vida como a um agasalho no frio, mas meu braço de agarrar o mundo nasceu amputado. Ainda assim é preciso desabafar, mas o quê? algo dentro ou fora de mim há que ser honesto e limpo, então eu tento acariciar algumas pessoas com essas tristezas. É o que sou, não é? o que você diria? lhe escrevo com o propósito  de receber uma ajuda sua e das crianças. Como vão todos? Apesar de tudo e qualquer coisa, eu estou bem. Mateus 11:28, caso esteja duvidando de algo.
Aqui vou morrer. Ou não...
A sentença é o cultivar da dúvida, o eterno cultivar da dúvida. Às vezes penso em andar sem rumo sob o Sol, mas aqui, não importa o quanto eu ande, nunca há ermo. Sinto vontade de ligar pra casa e dizer que estou triste, mas sento no boteco da rua do centro e o estigma do perigo da cidade cessa. Duas senhorinhas sentadas na mesa 5: deixo de lado qualquer coisa na vida, menos sentar e almoçar do lado dessas senhoras. Gosto de dividir a mesa com elas, pensar a vida mastigando sem sentir, sem ter como, engolir o feijão inteiro. Não sentamos exatamente na mesma mesa, nem essas senhoras me dão a mínima, mas o lugar é pequeno e a distancia é muito curta entre todos nós, e isso me alegra. É daí que a vida ressurge. Talvez tenha encontrado, agora, a salvação que procuro nas cartas endereçadas a você, Leopardo. Mas não.
Não moro na maior cidade do mundo, mesmo assim o medo existe. Atravessar a avenida me deixa triste. Olho pros meus pés: aonde vão? e se vão, vão sem mim e sem por quê. A vontade é de ligar pra casa e dizer que sou triste, mas é Domingo.
Há que se ter uma ideia, um plano, uma fuga! Até um sapo tem uma  ideologia, mas eu vivo como um pássaro com um papo cheio de vento e não vejo a solução em nada. A realidade é um passo fundo, meu querido Leo. Todos a tudo me conhecem, mas desconhecem.
Eu sou em mudo. Sou o papel com o apelo distribuído a cada passageiro. Eu sou o pedido de esmola silencioso no ônibus. Eu sou, Leopardo meu doce e querido amigo, meu grande e saudoso amor, um libertário do avesso com as réstias pro lado de dentro da própria alma. Onde está, de fato, meu tempo? arrefeceu em algum lugar. Você talvez pudesse me ajudar e mandar meu abraço a todos. Sinto muitas saudades, e sentir é sofrimento, mas um dia sofro tanto que esqueço.

Deixei o selo pago. Aguardo. 

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Gritinho

Por do Sol,
queridinha
às vezes não revela
sossego.

Anoiteceu
perdi amor
a todo meu apego:

Por teu socorro
gritei
de-ses-pe-ra-da-men-te
em grego...

terça-feira, 29 de outubro de 2013

cançãozinha de saudade


O teu rosto tem do lixo,querida
A forma da incineração
Digo porque sou um bicho
   [e não sei me defender
   desta condição]
Teu peito aberto é solo amigo
Um barreiro sortido de pastas
É doce o teu afago
Mas tens um gosto amargo
Quando te afastas...

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

cumpleaños

1985,
21
do mês quarto
meu amor é tão antigo
quanto a dor de parto

sábado, 24 de agosto de 2013

Gangungo, 13 de Setembro


Saudações sem fim,


Querido Leopardo, é com absoluta nostalgia que pergunto como anda você.
Trago novidades desde o Natal: a loja não vai tão bem como em Novembro, embora não seja esse o real motivo desta. Gostaria mesmo era de ser como os elefantes e partir quando tudo vai triste, porém, tudo na vida é entender, é uma questão de ordem ou de lógica, mas deixo por sua livre interpretação.
Tenho plantado em minha casa um pé de manga por dia, dizem que dá sorte quando cresce, só que  ainda não compreendi, meu querido, eu não entendo o mundo, não entendo as coisas, eu não entendo a sequência das coisas. Eu sou, Leopardo, um perdido. Às vezes, pouco antes de dormir, eu penso que a Ana morreu. Mas onde ela estaria agora? Deus a está castigando ou ele a estaria  santificando neste preciso momento? São várias, meu saudoso amigo, as intrigas, as dúvidas, as penas. A memória se perde quando morremos? "não estejais ansiosos por coisa alguma", contudo, se sou paciente, esqueço, pereço. Pra mim, a questão é de localização, de reconhecer o lugar pra se estar, mas os meus pés têm asas. A minha alma flutua sem saber pra onde vai. Você compreende, Leo, a inocência? ou devo dizer ignorância? por isso não sei e por isso a omissão nas brincadeiras de manja. Eu não sabia o que era coerência, meu querido, e lhe peço perdão a vida toda se você me abrir essa brecha. Minha alma toda vida flutuou sem saber pra onde quer ir, e é sempre outro lugar que não o que estou agora. Não há caminhos para a volta, meu amigo. Em tudo sou falho, desde o meu acordar. O que haverão de me confiar e por quê?  Este mundo não é meu. Nada é meu. Meus pés caminham sozinhos sem saber se querem chegar ou não em algum lugar. Há um travo na minha goela, há um demônio na minha cabeça e eu me perco, perco tudo até as chaves da minha casa, perco o ônibus e as horas, perco minhas roupas. Eu não lembro onde deixei o meu rádio antigo. Tenho olhos, mas não enxergo, eu minto assim como quando mentia que tinha feito a lição de casa ou que havia acompanhado o ditado, na 2ª série. Quero correr, mas tenho medo, quero morrer e é segredo. Eu não caibo em mim, mas não é uma questão de transbordar. Eu não caibo por folga, por sobra. Às vezes sinto que não penso, às vezes não sinto nada, e neste momento, nem isso nem aquilo. E para onde hei de ir quando não estou? serei eu um dos escolhidos ou serei só um esquecido na grande procissão de Deus?
Perdi as contas de quando quase morro no meio fio de uma parada de ônibus, num arrastão na feira, num atropelamento na Agamenon, num suicídio do 4º andar do Rafaela. Todos os dias eu desisto, meu amado amigo, e você conhece isso tão bem quanto eu. Não sei dizer as horas, não sei dar informação na rua, não posso chegar na minha casa, porque estou perdido, e morre-se um pouco ao se perder nas pequenas coisinhas do dia a dia. Por isso estou mandando este apelo pra você me socorrer. Estou implorando um conforto, Leopardo. Eu sou um doente, a minha alma tem um câncer.





Responde, pago o selo.


segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Manhãzinha

Acordo
E ainda é ontem,
Minha casa ainda existe.
Tenho pernas para a rua
E olhos pro horizonte
Mas sou triste.

sábado, 27 de julho de 2013

Demissão

Tentei
Mas o grito é um incêndio
Sem a chama
O espírito é traiçoeiro
A carne engana:
Minha vida é uma morte
À paisana.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Saudoso leopardo,

Eu vou nadando, meu querido
que um  bom nado é quase voar
mas meu nado é tão sofrido
e sem braços é difícil  arriscar
minha alegria nem chegou na praia
morreu em alto mar.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Vencido

Dentro da minha goela tem um grito
E nele, cabe o infinito
Cabe muito mais do que sinto
Que às vezes, parece que esqueço
Sou tão estranho que sou do avesso
Inferior sou ao que ofereço
Minha entranha é um milho de vazante
Uma carta enviada sem endereço
Meu corpo é um ataque fulminante.
Sou tão cheio de vazio, que pereço
Criança prestes a cair berço
Sou um  tanto que só cabe num instante.
[Ando sempre cansado por dentro]
Por ora,chega!!(lamentos..)
Eu me prazo de validade venço.

segunda-feira, 24 de junho de 2013

Escolhazinha egoísta

Estamos sempre sós
não importa com quem
eu escolhi a mim mesmo
porque muito me convém.


sábado, 15 de junho de 2013

Travinha na janela



Inacinha, eu te amo, volta pra casa que eu te dou uma agrado.

terça-feira, 11 de junho de 2013

Chorinho

Não chore, queridinha
Amor não morre nem mata
Não tire a faca da bainha
Não vomite do bucho a fava
"Carne não se parte com linha"
Assim minha vó cantava.
O leite nem foi derramado
Morreu no peito da vaca.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Itapemirim

Mês passado tirei as malas
fiz, refiz feito louca.
Na viagem da minha cabeça
o coração foi na boca.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Carruagi

A tristeza é carrasco,
querida
pois a vida avilta a mente
passas e não me vês
pois não me olhas, simplesmente.

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Burro

O tempo
de amor nada entende
amor nunca dura
o suficiente.

sábado, 25 de maio de 2013

Canção de ninar a sexta

Um dia triste é um pulso cortado,
um bocejo mal dado,
um braço que se perdeu.
Um dia nublado
é ferro cortante e gelado,
os olhos cozidos num caldo,
uma ferida que ardeu,
meu coração vacilante
em orações suplicantes
debaixo dos pés de Deus.

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Ordem

A vida é um acidente
sem resgate:
que debaixo de sua própria sombra
este poema vire uma bomba
e me mate!

Cantiga de amor

Em Taperinha é tudo verde
E da rede,
Uma velhinha canta me chamando,
O barro escuro esfarelado na parede
O som da paz ruminando

Viver olhando os passarinhos
Jamais deixa
De ser vicio meu.
Quero morrer em Taperinha
Já mandei um ofício pra Deus.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Bilhetinho carinhoso

Querido amor meu,
o amor pereceu.

sétimos dias


Primeiro
Deus fez o samba;
a tristeza
no segundo dia.
Terceiro
teu quadril na dança;
o quarto
foi só mais um dia.
No quinto
a tua lembrança,
o resto, amor
minha agonia.

sábado, 18 de maio de 2013

Carta a um Leopardo

Surubim, 18/05

saudações sem fim,


A beleza está na tristeza, meu caro Leo. A beleza está na tristeza, porque a tristeza é honesta, é limpa, é crua. Muita felicidade é arranjo, é como enfeite que colocávamos na árvore de Natal. Não há, meu querido e saudoso amigo, beleza na falsidade. Não há beleza no fingimento. A beleza está na pureza, e nada é tão puro quanto uma tristeza bem triste. Mas apesar de tudo isso e dos outros pesares, é claro, a tristeza tem esperança.
A tristeza tem sempre a esperança de um dia não ser mais triste, não.
Que Dios te bendiga.




Responde, pago o selo.

terça-feira, 30 de abril de 2013

Segunda


Tem coisa que te toca
Como fosse pano de pia
E vive como quem vai
E fala como quem chia.
Mas um dia a casa cai
Ou fica vazia.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Ads Qrd


Pra que sofrer, querida
Se tu me adoras
Mas vai chover
E não tem hora.
E se à noitinha
Eu falecer
Quem garante
Que tu choras?

Pra que sofrer
Se a vida é mansa
O céu é claro
E a tarde dança?
Mas todo dia
do meu quintal
Basta te ver
E o amor faz mal.

quarta-feira, 17 de abril de 2013



Esses dias
tem passado
que eu mal vi.
vou andar, tropeço
vou saltar, aleijo
vou viver, morri.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Separação I

estar dividido
é como um tiro
no peito já ferido
Como amar o bandido
que em mim atirou.
Um tiro vem aceso
claro, chama,
chumbo preso
pólvora que estourou.
minha alma é uma vela
exposta ao vento na janela,
que se apagou.

quarta-feira, 20 de março de 2013

domingo, 10 de fevereiro de 2013

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Tiro

O amor que me mentiste
Foi, de perto, a chuva rara
A arma que atira
O elemento que a dispara.
Com a pedra que jogaste
Embora o alvo que erraste,
Faz de conta que quebraste minha cara.